23.5.18

Diferenças contornáveis

Quando eu era mais nova, ficava me perguntando se um dia iria me juntar com alguém que compartilhasse os mesmos gostos pessoais. Alguém que fosse uma espécie de cópia minha e se encaixasse num questionário de similaridades. Infelizmente, como nada é simples nesta vida, na primeira vez que isso aconteceu, convivi com um cara que, por exemplo, não tinha paciência para livros e livrarias, tampouco gostava que eu lesse enquanto ele estivesse em casa. Para mim, que não esperava um rompimento tão grande com as coisas que faziam parte da minha identidade, o tempo que durou essa relação foi um período de renúncias forçadas.

Hoje em dia, com espaço para ler quando eu quero, percebo o quanto é importante dividir a vida com alguém que seja parecido comigo, mas também percebo que esse é um conceito limitado. 

Veja bem, eu adoraria estar com alguém que me acompanhasse nas leituras ou que soubesse o nome dos meus escritores favoritos, mas me conformo com alguém que entenda que livros fazem parte de quem sou desde sempre. Também amaria dividir um café fresco ou experimentar um sabor diferente, mas me conformo com alguém que compreenda que preciso de cafeína para viver.

Não sei se cansei ou se evolui mentalmente, o fato é que parei de limitar meu envolvimento com as pessoas por causa de diferenças bobas.

Não faço mais questão de sair apenas com alguém que goste filmes de arte e séries europeias ou que entenda de enquadramentos, câmeras e tipos de lentes. Nem que entenda de gastronomia, nem de blogs, nem de plantar suculentas, nem de organização. Existem coisas que amo, mas que os outros não precisam amar de volta. Só precisam respeitar, assim como tenho que respeitar os interesses deles. 

Certa vez namorei um cara que achava que livros demais era bobagem. Por ele, era melhor que eu desse ou vendesse todo os meus livros já lidos. Eu achava que sofrer por um time e assistir todos os jogos era uma puta bobagem. Para ele, era algo importante. 

As pessoas costumam dizer que os opostos se atraem, no entanto, acredito que isso só funcione bem com os elétrons. Viver com alguém completamente diferente não funciona. É desgastante, frustrante, solitário – principalmente para o lado que está sempre cedendo e abrindo mão das coisas que gosta por causa do outro. 

A questão é: existem diferenças que são contornáveis. Eu não dispensaria uma pessoa por ela ter um gosto musical diferente ou por ela não gostar de comida japonesa. Por ela gostar de filmes de comédia ou preferir dormir até tarde. Eu dispensaria se ela tivesse um estilo de vida incompatível com o meu. Se nossos desejos para o futuro fossem opostos. Se eu precisasse me anular para me encaixar no mundo dela. 

O resto é aprendizado. E a oportunidade de ser surpreendida por alguém que, num primeiro momento, não parecia interessante.