Café indigesto

Arrumo toda a cozinha, pois não sei comer em lugares bagunçados. Coloco as torradas na panela e espero ficarem prontas. Enquanto isso, procuro o filtro, a xícara rosa e o pó de café. Em algum instante entre as ações, o telefone toca.

- Alô?
- L.? Passei!
- Ah, é?
- Foi, passei no vestibular.
- Que bom. Parabéns.

Ligação ruim. Silêncio. Desligo de propósito. Não sou assim rude, sou até educada demais na maioria das vezes. Mas o negócio é: ser surpreendida no meio do café da manhã pela prima super distante e inconveniente - fã do Zezé de Camargo e Luciano, que queria fazer radiologia porque achava que esse era o curso de quem trabalhava com rádio, e que aos 20 e poucos anos ainda não tinha terminado o 2° grau porque não estudava como devia - corta o barato de qualquer um.

Eu nem lembrava mais dela. Na época de pré-adolescente essa criatura adorável aparecia na minha casa sem avisar ou ligava e passava horas falando um monte de besteiras. E ela era tão simpática, que uma vez disse que eu tinha os peitos engraçados, que pareciam de mulher amamentando. Como é?!

Pulando esses detalhes... Estava eu, seguindo o curso da vida e sem ter notícias dela por vários anos, meio feliz por não ser mais incomodada com bobices sem fim, quando o telefone toca e mostra que a fênix voltou. Para o meu terror e para testar a minha pobre paciência.

Pessoas, quero morar em uma casa sem telefone.